Ser
assaltado é horrível!
A sensação
de impotência que se instala na gente depois ter uma arma apontada pra sua
cabeça é algo inexplicável. Nos deixa no chão. Nos sentimos lixo.
E quando um
ato destes acaba em uma fatalidade, um ferimento grave, uma lesão irreversível,
uma morte, bom, aí eu nem imagino o tamanho desta dor. Mas é certamente
imensamente maior do apenas ser roubado.
Nestes dois
casos, o ódio, a revolta, a sede por vingança, às vezes até mesmo na mesma moeda,
podem vir muito facilmente.
Mas, todas
as reflexões que eu tenho feito, todo o conteúdo que eu tenho consumido, e
principalmente, o fato de eu ter me tornado mãe, me fazem a cada dia repensar essa
nossa facilidade de decretar sentenças.
Não consigo
mais ver uma reportagem em que homens foram mortos em uma perseguição pela polícia
após uma tentativa de assalto, sem pensar no que pode ter acontecido na vida deles
pra que chegassem até aquele momento.
Não consigo
mais ouvir uma pessoa comentando que um conhecido teve seu celular roubado por
um ”vagabundo”, sem pensar no quanto este “vagabundo” estava sendo consumido
pelo desejo de mais uma dose de uma droga qualquer.
Não consigo
mais ver adolescentes serem presos acusados por tráfico de drogas, sem pensar no
desespero das mães daqueles guris, que ao receberem a notícia se
condenaram tentando entender onde foi que elas erraram.
Essas
reflexões se instalaram na minha cabeça a partir do momento que eu comecei a me
dar conta de quem são estas pessoas. Quem são estes caras que ao invés de
trabalharem honestamente querem ganhar a vida roubando o que é nosso? Quem são estes
pivetes alocados nas esquinas vendendo drogas aos nossos jovens? Quem são estes
“nóias” enfeiando nossas ruas?
Pois eu sei
quem são: são meus irmãos, são meus sobrinhos, são meus primos, são meus afilhados;
são meus filhos, são meus vizinhos.
É o povo
preto e pobre que está marginalizado, é o povo preto e pobre que está sendo
preso, e é o povo preto e pobre que está morrendo.
E isto não
sou eu quem digo, são as estatísticas: em média, 66% dos jovens infratores vivem
em famílias extremamente pobres, e 60% são negros.
No Brasil, desde
a suposta libertação do povo preto, mais de 100 anos de abandono e descaso pela
sociedade se passaram. Mas para muitos, pouco mudou, pois mesmo após gerações e
gerações, permanecem às margens, sem conseguir quebrar o ciclo de pobreza e
ignorância.
Eu sei que tem um montão de preto e pobre por aí trabalhando honestamente, estudando, se formando. Sim, e que bom, que ótimo! Mas não se engane, esta não é a regra. Não menspreze a força que é necessária para vencer centenas de anos de atraso em um país onde nada foi feito pensando no nosso povo.
Por isso, e
por diversos outros motivos, eu temo ser assaltada e ferida nas ruas, como
qualquer outra mulher. Mas como mulher negra, eu tento sempre me lembrar que se
algo acontecer, provavelmente será o meu irmão (homem preto), que estará diante
de mim, e eu não posso/não quero vê-lo como um inimigo.
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